13 novembro 2008

As canções pop do Sigur Rós




Em 23 de Junho desse ano, as lojas virtuais e as lojas físicas de venda de CDs e vinis de grande parte do Hemisfério Norte receberam "Með suð í eyrum við spilum endalaust", o impronunciável álbum novo do Sigur Rós. Certo, minha cópia é japonesa, saiu dia 2 de Julho mais com uma faixa a mais: "Heima" (uma versão com letra daquela apresentada no filme de mesmo nome, de 2007).



Uma rápida explicação para quem está aqui mas ainda nada (ou quase nada) sabe sobre Sigur Rós: banda islandesa que surgiu em 1994 e gravou seu primeiro álbum completo em 1997. A característica mais marcante da banda é som por vezes alienígena. o vacalista canta em falsete em uma língua inventada enquanto arranha um arco de cello na guitarra distorcida. As música tem mais de 7 minutos e são lentas, com ocasionais explosões.



Agora, diante das informações do parágrafo acima, pergunto: você já ouviu eles tocando em alguma rádio? Talvez, seja 'sim', se você morar no Canadá, na Austrália, na Inglaterra ou na própria Islândia (principalmente). Mas, provavelmente será 'não', assim como é a minha e a de vários outros fãs que conheço. Acontece que esse impronunciável álbum novo teve uma recepção suspeita por parte dos fãs. Por quê? Porque era pop demais!



Aqueles apreciadores da dita música alternativa, por vezes se gabam de conhecer algo que ninguém mais conhece. O argumento é de que possuem o gosto mais refinado e sabem selecionar e escarafunchar melhor as Last.Fm e Amazons da vida. Então, se a banda cresce e se torna um pouco mais famosa, caí no desagrado desses fãs de outrora. Já vi isso acontecer com "Coldplay" (ninguém conhecia os caras na época do "Parachutes" e muita gente gostava, hoje é uma das bandas mais famosas do planeta e ninguém mais gosta). Pobre banda! Não podem ganhar dinheiro, mulheres (ou homens) e atenção.



Então, para os incautos, antes de falar sobre o que propõe o tópico, devo algumas explicações: um artista é um trabalhador. Ele não vive só de inspiração, ele estuda, se esforça e arrisca. Como qualquer trabalhador, ele quer ganhar um dinheiro e um reconhecimento pelo seu trabalho. Ele precisa comer e dormir, ele gosta de viajar e comprar livros, sua casa também precisa de papel higiênico e seu consorte gosta de ganhar pesentes de aniversário. Eles são pessoas, só (tudo) isso. Se um Thom Yorke da vida quiser ganhar mais publicidade com álbuns gratuitos e camapanhas ambientais ou se ele quiser gravar músicas com Bjork e Jack White, isso não significa que ele está se vendendo, nem que sua qualidade como músico diminuiu. Isso só significa que ele está tentando coisas novas e que ele quer dinheiro e reconhecimento por isso. Como eu ou você, aposto.



Por quê tudo isso? Simples. Esse novo e impronunciável álbum do Sigur Rós foi produzido por Flood (que também produziu álguns do U2, Smashing pumpkins, P J Harvey e outros) em parte em New York e em parte em Reykjavík (com apenas uma música gravada no Abbey Road, em Londres). Só isso já gerou um desconforto. Sigur Rós contratar um produtor que não seja Ken Thomas ou eles mesmos? Sigur Rós gravar fora da Islândia? Claro, houve aqueles mais espertos que pensaram que isso significava que a banda tinha mais recursos e um reputação melhor, o que permitia que eles acessacem um amparato tecnólogico mais eficiente para a gravação de maior qualidade.



Depois veio a notícia que quase todo o disco seria cantado em islandês (e não na língua inventada pelo vocalista Jonsi) e que haveria um música em inglês. Alvoroço geral. Como o Sigur Rós poderia gravr em inglês? Eles não são muito fluentes na língua e agora querem consquistar um público mais amplo numa jogada comercial? Confesso que eu, um amante de línguas, fiquei meio frustrado também. Mas, doce engano: qualquer que ouvir a música "All right" (décima primeira faixa do álbum) vai ficar se perguntando como aquilo pode ser inglês ou qualquer outra língua conhecida, hehehe.



Pois bem, não bastasse isso, no final de Maio e no início de Junho vieram as primeiras audições. A música "Gobbledigook" foi liberada gratuitamente para quem quisesse saber como soaria o novo travalhado da banda. Até então, o que nós fãs conseguíamos saber era que se trataria de um disco mais acústico, com ênfase nos violões, baterias e arranjos de corda, de certa forma semelhante ao último registro em estúdio da banda: o excelente EP "Hvarf/Heim" (que acompanhou o lançamento do documentário "Heima", sobre concertos da banda ao longo da Islândia, no verão de 2006).



"Hvarf/Heim" era um EP duplo. De um lado ("Hvarf" - "porto"ou "desaparecido") havia novas versões de músicas antigas ou nunca antes gravadas em estúdio. Do outro ("Heim" - "lar" ou "terra") havia versões acústicas e ao vivo do que se poderia chamar de 'sucessos' da banda. O que esperar de um álbum novo? Um retomada ao estilo que consagrou a banda no passado (coisa que não ocorreu com o quinto álbum, "Takk...", de 2005), porém um pouco mais agitado e ao mesmo tempo leve.



Com "Gobbledigook" o que foi ouvido? Uma música curta (3:05), com batidas rápidas e incasáveis, violões , palmas, coros de "la la las" e um ritmo quase tribal, quase hyppie. Pela primeira vez, diria alguém, você poderia usar Sigur Rós em uma festa! O que era quilo? Eu adorei, claro, tudo o que a banda faz me agrada. Mas, o som me agradou de verdade. A mim e a milhares de outros fãs pelo mundo. Ao mesmo tempo, muitos fãs brasileiros e estadosunidenses torceram o nariz. A afirmação era: o Sigur Rós se vendeu; música alegre é feito para vender, não é para gente inteligente.

E o clipe de "Gobbledigook", então? Era polêmico, com gente nua dançando e brincando em algum lugar bonito. Um clipe rápido, ao contrário das slow motions dos clipes anteriors (esses sim polêmicos e chamtivos, com crianças excepcionais, homossexualismo, catástrofes e idosos vândalos). O clipe se inspirava na controversa arte da capa do impronunciável álbum novo.

E foi assim que houve um êxodo. Sei que parece dramático de mais, mas vi surgirem grupos de ex-fãs do Sigur Rós, que renunciavam gostar da banda depois de um álbum tão 'acessível', como eles chamaram. Isso por que ninguém ainda havia ouvido o álbum todo. (Embora, devo dizer, que quando o álbum de fato chegou, a reação foi a mesma, afinal, metade do álbum possuía um ritmo frenético de músicas de bêbados em um acampamento).



Então, pergunto: qual o problema? O Sigur Rós não poderia querer ganhar dinheiro? Os caras não podem amadurecer e perceber que aquela sonoridade de 1999 não representa mais a mesma coisa ou os mesmos interesses que eles têm hoje? Renovar é um crime? Experimentar é um pecado? Entretanto, a resposta veio em uma reflexão mais simples... Alguém acha mesmo que um dia as rádios vão tocar músicas como "Gobbledigook"? Ora, penso que o dia em que isso acontecer, vai ser um sinal de as rádios estão abrindo suas mentes para novas opções e qualidades!



Também penso que qualquer um dos que reclamaram de "Gobbledigook", quando a ouvissem tocando numa rádio, aumentariam o volume, parariam o que estavam fazendo e iria cantar junto, bem alto. Sigur Rós assinou um contrato com um gravadora maior (a EMI) em 2000, depois do sucesso de "Ágætis byrjun". Dizem que eles até tiveram ofertas mais lucrativas, mas ainda assim eles escolheram a que permitia maior liberdade artística. Apesar disso, algumas de suas músicas circularam em filmes como "Vanilla sky" e séries como "CSI" ou "24 hours". Isso é ser pop!



Em 2002, quando o Sigur Rós lançou um disco chamado "( )" (sim, 'parênteses' ou 'o álbum sem nome'), fizeram uma verdaeira manobra comercial. O disco não teria nome, as músicas não teriam nome, tudo seria cantado no 'vonlenska' (a língua inventada mas que nada significa) e o encarte teria uma página em branco para cada música,d e forma que o comprador do álbum pudesse escrever suas próprias letras. Contudo, para orientação da banda que não queria ficar chamando suas músicas de "Untitled 1", ou "Track 3", ou ainda "#4", nomes foram dados (e depois oficializados com o lançamento de "Hvarf/Heim". E a última faixa do disco se chama "Popplagið", famosa em concertos da banda desde 1999. O título significa "canção popular". Isso é pop!



E ainda, nos primórdios da banda, depois de gravarem o primeiro álbum, "Von", insatisfeitos com o resultado, lançaram um álbum só com remixes do "Von". Isso é pop! Pop é compôr músicas populares (independentes de qual povo), canções que toquem as pessoas de alguma forma. "Ný batterí", por exemplo, segundo single da banda dentre vários, é muito executada por fãs e possui uma estrutura bem convencional para o rock, ou algo que o valha (assim como "Glósóli", "Hún Jörð", "Njosnávelin", "Gong", "Myrkur" e a própria "Ágætis byrjun"). "Hoppíppólla" é uma das músicas favoritas dos fãs (até tocou no meu casamento) e é extremamente alegre, clichê e rápida, tem sido veícula junto com propagandas ambientais e trailers (assim como "Starálfur"). Isso é pop!



Agora, uma banda que lança álbuns, singles, eps e documentários não está interessada em ganhar dinheiro ou chamar a atenção? Eles só querem mostrar a arte? E a vaidade, o luxo e o essêncial, onde ficam? Por favor! Qualquer um que escutar o impronunciável álbum novo do Sigur Rós vai perceber quão esquisito é aquele som e como não vai aparecer em rádio alguma tão cedo. Até lá, enquanto a banda continua no anonimato para a alegria dos fãs 'alternativos', ñão há previsão de lançamento do álbum por aqui ou de shows nesse continente. Isso é pop?

Um comentário:

Anônimo disse...

Aleluia!