08 julho 2009

Antologia de contos sobre o fim do mundo.

Finalmente, abro espaço para um novo marcador de tópicos discutidos nesse blog: "eu escritor". E, por se tratar de mim mesmo (afinal, como alguém poderia escrever algo que não fosse si mesmo?) e por se tratar de escrita (algo que desenvolvo aqui e algo sobre o qual desenvolvo aqui, também), peço que tenham paciência e se preparem para um texto longo e dramático, como só um texto biográfico poderia ser. Vejam só, até dei uma organizada no layout deste texto para amenizar a pieguice.

Pois bem, eu me lembro do meu último dia de aula no Jardim III (aquele ano escolar que antecedia a primeira série, e que ninguém sabia o que significava ou para que servia). Eu estava extasiante. A partir de então, eu poderia ler qualquer coisa que surgisse na minha frente. Eu já sabia todas as letras, até o o famoso "z". E foi então, como mágica, voltando para casa e pensando no video-game do Mario que iria jogar durante todas as férias antes de dar mais uma passo na minha educação, que meu primeiro grande desejo de vida surgiu: "quero ser um escritor".

E assim foi, quando crescesse, eu gostaria de ser um escritor. Essa deveria ser minha profissão, pois parecia a melhor do mundo (e ainda parece). Mas, esse foi apenas um dos desejos. O outro surgiria em decorrência da leitura. Naquele dezembro de 1989, lendo o "Manual do escoteiro mirim", descobri sobre os castelos e paisagens da Escócia. Nasceu ali o meu segundo grande desejo de vida: "Quero passar um tempo em outro país". Imediatamente, o terceiro e último grande desejo de vida acompanhou a lista: "Quero me casar com o verdadeiro amor para poder passar um tempo em outro país".
O tempo passou, obviamente. Orgulhosamente comprei e li meu primeiro livro ("Menino maluquinho", do Ziraldo) e comecei a escrever minhas primeiras histórias. Todas precariamente ilustradas e sempre sobre personagens de video-game, desenhos animados e contos que lia, afinal, eu tinha entre 7 e 9 anos. Foi só com 10 anos, que escrevi minha primeira história de verdade, como digo. Chamava-se algo como "O dia final do soldado eterno no campo universal" (um título quase do tamanho da história e que ambicionava mostrar algum conteúdo filosófico initeligível). Enfim, tratava-se de um conto sobre um militar aposentado morrendo de câncer devido a radiação da última guerra em que participou. O conto narrava os eventos finais de sua vida, quando este levava sua família para visitar o campo onde se travou a tal batalha, para que ele anunciasse o seu derradeiro e iminente fim.
Minha professora de ciências levou o texto para casa, leu, chocou-se e, no dia seguinte, me devolveu dizendo que não deveria me preocupar em escrever. Principalmente histórias com aquele conteúdo. Ela achava que uma criança feliz deveria brincar. (Curioso como na quinta série minha professora de português, que me odiava, dizia que ela nunca viveria para trabalhar um livro meu com os alunos dela; curioso, também, como no primeiro colegial a psicóloga da escola afirmou que meu problema era que eu lia demais e isso nunca me ajudaria).
Durante aquele resto de ano, não mais escrevi. Só retomei a escrita aos 11 anos, depois de uma série de eventos na minha vida e quando comecei a ler livros de vedade (como sempre digo). Influenciado pelo "Mundo de Sofia", escrevi "Cartas para um palhaço" (que considero minha primeira história séria e bem feita, muito embora hoje eu a ache terrível, simplista e vergonhosa). Depois disso, conheci Edgar Allan Poe e toda a minha vida mudou. Entendi que de fato eu poderia escrever algumas coisas que vinham na cabeça e poderia fazê-las bem feitas. ("Frankenstein", de Mary Shelley, também surtiria um efeito parecido, porém mais amplo, no ano seguinte).
Assim, escrevi contos policiais, contos de horror, contos de mistério, contos de morte e mais contos filosóficos até meus 15 anos, sempre pretendendo um dia publicar meu próprio livro de contos. Mas, algo aconteceu... Com 15 anos, li um livro do qual ouvira falar e ficara curioso desde os 14: "O senhor dos anéis", de J. R. R. Tolkien. Jogador de RPG desde os 11 anos (outra forma de contar histórias, diga-se de passagem), não podia deixar de ler sobre elfos e dragões. Naquele dia primeiro de abril em que comecei a ler, um pensamento me sobreveio: "posso, então, escrever sobre mitos e folclores".

Começaria a escrever minha primeira história longa, casualmente. Chamava-se "A lenda do elfo" e era divido em oito partes, cada uma contendo 15 contos em sequência, todos descrevendo um memsmo personagem. A idéia surgiu sem querer. Primeiro veio um conto, e, de repente, eu tinha escrito um outro conto onde aquele personagem aparecia. Percebi que podia contar toda a sua vida e fui escrevendo tudo fora de ordem para depois organizar linearmente (um procedimento parecido com o que Robert E. Howard fez com Conan). Mas "A lenda do elfo" mudou de nome, mudou de proposta e nunca foi para frente, nem deve ir. O melhor momento que a série teve foi uma longa e bela campanha de RPG!

Ciente de que poderia escrever fantasia, mas não desejava escrever fantasia, era hora de abrir meus olhos para novas letras. Conheci a literatura fantástica de Jorge Luis Borges e de Neil Gaiman. Era aquilo que queria escrever. E foi escevi desde então, embora o período da faculdade de psicologia tenha tido hiatos significativos na minha produção amadora.

E, mais uma vez, como sempre, o tempo passou. Ainda não era um escritor profissional e por tolice e medo, recusei possibilidades de publicar. Mas, então, eu já estava casado. Meu primeiro grande desejo muito bem realizado. E, logo em seguida, graças a minha verdadeiramente amada esposa, eu estava de viagem para o Japão, só a passeio, durante um mês. Um lugar em que eu nunca pensara em visitar e que mostrou o melhor lugar que o mundo poderia conceber (embora me falte conhecer todo o resto do mundo). Outro grande desejo da minha vida estava muito bem realizado. E assim como meus desejos nasceram juntos e entrelaçados, eles iriam se realizar juntos e entrelaçados.

No avião, sozinho, num vôo entre Tokyo e Izumo, vislumbrei o imenso e imponente monte Fuji. Pensei e anotei, ali mesmo, no meu diário: "O que aconeceria se a mulher, cujo corpo é o próprio monte Fuji, um dia resolvesse e se levantar e ir embora?". Até hoje não sei a resposta para essa pergunta e nem para tantas outras que surgiram durante a viagem. Mas, como toda boa pergunta, ela nunca saiu da minha memória. Pelo contrário, despertou várias outras perguntas.

Por exemplo: uma bela tarde, depois de trabalhar o dia todo para ganhar pouco e mal conseguir sustentar minha nova família de esposa e gatas, eu caminhava. Caminhava vendo um pôr do sol laranja e a mais movimentada avenida da minha cidade com centenas de carros e pedestres se expremendo violentamente. Não sei qual era o ruído que a cena produzia pois meu mp3-player estava em meus ouvidos. Tocava a música "Sæglópur" do Sigur Rós, do álbum de 2005 "Takk...". Quando o "Takk..." saiu, minha esposa ainda era minha namorada, e ela estava no Japão, de onde me trouxe minha cópia do tal álbum. Ouvindo a música fiquei me pensando em como nos matávamos para trabalhar e não aproveitávamos anda, em como a vida se tornaria selvagemente louca e todas essas outras crises existênciais típicas. Eu via o pôr do sol e me perguntava como ninguém aprava o que estava fazendo só para agradecer e louvar o sol. Mas, logo em seguida, a música acabou e deu início a "Hoppíppolla", também do Sigur Rós e também do "Takk...". O piano suave e alegre iniciava a melodia eos arranjos de corda. Foi com essa música que me casei. E me casei dentro de um ritual pagão, como não podia deixar de ser. E me casei a beira do Rio Grande, no pequeno vilarejo de Peixoto, onde moram apenas trabalhadores da usina hidroelétrica da região. Lá que passei minha lua de mel. Lá mora um lugar do meu coração desde que conheci. As montanhas, as águas, a paz, o vazio...




Com lágrimas nos olhos, surgiu uma nova pergunta: "o que aconteceria se o Rio Grande se levantasse e fosse embora sem avisar nada e nem ninguém?". Voltei para casa correndo, larguei as compras sobre a mesa, liguei meu computador e respondia essa pergunta. Até hoje, julgo ter sido o melhor conto que escrevi (e, inegavelmente, inspiradíssimo no realismo mágico e nof ormato dos diálogos escritos pelo meu maior influenciador desde o ano passado: José Saramago).

O conto chama-se "Na manhã seguinte" e é o conto que encerra a antologia "Dias contados", lançada pela Editora Andross no dia primeiro de agosto desse mesmo ano, na Biblioteca Temática Virato Corrêa, em São Paulo, a partir das 15 horas. O livro conta com 50 contos, sendo dois meus, um argentino (maravilhoso, diga-se de passagem) e um da escritora fantástica e revisora Helena Gomes (que eliminou todas as minhas características de Saramago para manter o padrão da editora). O livro é editado pelo quadrinista Edson Rossato e é organizado pelo administrador e escritor Danny Marks (cujo primeiro livro, "Universo subterrâneo", sai dia 7 de agosto, em Santos, mas minha cópia dos contos, autografáda, já está a caminho) e pelo crítico de cinema e escritor Ricardo Delfim.

Meu conto, "Na manhã seguinte", foi editado e revisado por Danny Marks (um bom amigo bruxo, hoje em dia). A edição foi feita de forma bem respeitosa, com discussões, sugestões e questionamentos dos lados, mantendo minhas palavras, minhas idéias, mas um pouco da visão mais ampla do Danny, afinal, ele era um dos organizadores. o outro conto, "Sete minutos", está na página 43 do livro. E, por opção minha (e sugestão do Danny), foi editado e revisado pelo Ricardo. Como já tinha um conto aprovado no livro, a ansiedade e pressão sobre mim era menor para que se aprovasse outro conto (embora, obviamente, queria muito sentir, de novo, o coração disparar, as mãos e a voz tremerem, os olhos marejarem e a boca se abrir apenas para inspirar e expirar o momento de ler "seu conto foi aprovado, parabéns"). O trabalho com o Ricardo, portanto, não contaria com nenhum proteção e foif eito de forma bem interessante, uma experiência rica para mim, trabalhar com outro editor/revisor. Nós trabalhamos de forma mais incisiva e prática, por assim dizer, com sugestões mais pontuais e drásticas do Ricardo, o que levou a um resultado final bem interessante.

Então, leitores, leitoras, amigos, amigas, familiares e, especialmente, minha amada, sai agora minha primeira publicação oficial e reconhecida. Não é só minha, mas já é um primeiro passo, não é uma editora de nome grande e pesado, mas é uma editora séria que busca lançar novos autores. Meu último grande desejo de vida se realiza. Agora eu posso morrer? Claro que não. Quero continuar casado, quero viajar mais e quero publicar mais e mais.

Mas, quer saber como surgiu o outro conto, "Sete minutos"? Bem, foi com um pergunta. Eu estava feliz e incrédulo de que um conto fora aprovado apra ser impresso em papel e distribuído pelo país. Era uma quinta-feira. Eu estava jantando com miha esposa e nossa situação financeira e profissional já estavam bem melhores (até começávamos a pensar em um dia visitar a Islândia, outro daqueles lugares perfeitos). ela falava sobre como o trabalho dela, na Secretaria da Saúde, era apocalíptico: epidemias, catástrofes naturais, violência. Ela disse que não estranharia nem um pouco se o celular dela tocasse naquele instante, anunciando uma invasão alienígena ou um ataque zumbi. Foi quando me veio a pergunta: "será que a prefeitura tem algum departamento público de segurança no apocalipse?". No sábado, acendi um cigarro, e respondi essa pergunta.

3 comentários:

Solange Bispo dos Santos disse...

Moreco
é tão legal ver como tudo está bem, como tudo está bem quando acaba bem, como tudo está bem quando começa bem. Toda a história que vc conta termina no livro, toda a história que vc conta começa no livro. Quanta coisa para terminar, quanta coisa para começar.
Amo vc.

Unknown disse...

Agora nada mais resta a não ser esperar...
Esperar pelo dia em que poderei comprar o livro de contos, esperar na fila looooonnnnngaaaaaaa, e, finalmente ganhar a dedicatória do meu amigo e escritor preferido.

Danny Marks disse...

Eli,já que me avisou que Eliandro é só para noticias ruins rss,

Foi um imenso prazer ler e revisar o seu conto e não tenho dúvidas que serão sucessos ambos os textos.

Ainda vou ver você lançando o seu livro solo que pretendo colocar na minha estante entre os meus preferidos.

No papel do revisor chato eu tenho que dizer que o meu livro será lançado no dia 08/08 em Santos, no Ao Café, e não é uma boa desculpa você já ter comprado antecipadamente para não comparecer e tomar um café comigo rss. Se perdeu o endereço, é na Siqueira Campos, 462, a partir das 17h00.
Será uma oportunidade de assumir o papel de crítico da obra e se vingar do cara que te aporrinhou rss.

Mais do que um bom escritor para a antologia que estavamos organizando, eu e o Ricardo conseguimos um excelente amigo.

Parabéns pelo seu blog e sucesso, você faz por merecer.

Abração

Danny Marks